O dia é nove de fevereiro deste ano de dois mil e onze. É dia de letras, as letras de um dia sem história, vazio, dia de retaliação e terror gratuitos. Ocorre-me tomar o esquecimento como remédio. Deixaria de ser eu mas seria outro eu, outra coisa, um vazio preenchido. Brilha o sol lá fora. E brilha também hoje.
O dia de hoje é qualquer coisa de fevereiro do mesmo ano de dois mil e onze e, do céu, descem furiosas gotas de água e pedras de gelo sobre quem passa. Quando o sol imprevisto, loucura de dia cinzento, incide nas poças de água que se formam aqui e ali, junto aos passeios, antes de serem esvaziadas pelo passar dos carros, a pedra da muralha de Évora fica cor de terra seca e de seara madura, lugar comum por estes lados. Toca a esta hora o sino fraco a avisar quem veio ver os mortos, seus ou alheios ao cemitério.Ouve-se o sino ao sol, como se caísse lentamente a noite e precisassem os mortos de ficar em casa, sem mais incómodos de visitas. Dentro das paredes do cemitério nada haverá, além de morte e, nessa morte de sepulcros brancos de mármore e corpos deitados, de terra seca e molhada, há todo um cenário de raios de luz amplificados, uma claridade paradoxal que atrai, muito além dos ciprestes de má fama. Diz-se, não importa se é assim ou não, que na morte se atravessará um túnel e haverá uma luz extasiante que cega e tudo o mais. Há, num cemitério de túmulos brancos de mármore, em momento de loucura solar, luz mais do que suficiente para que um vivo sinta que não está no seu mundo. Que não se percam os vivos em cemitérios destes, pensariamos nós. Toca, último aviso, a sineta que avisa os vivos. A hora avança e faltam agora três minutos para as dezassete. Sai quem tem hora para sair, fica quem não respeita já ou nunca respeitou essas convenções. Não usarão relógio os mortos do cemitério dos Remédios, em Évora, aqui ao lado do carro onde espero que a aula de música do meu filho acabe. Vai chover outra vez quando abro a porta do carro e saio.
O dia de hoje é qualquer coisa de fevereiro do mesmo ano de dois mil e onze e, do céu, descem furiosas gotas de água e pedras de gelo sobre quem passa. Quando o sol imprevisto, loucura de dia cinzento, incide nas poças de água que se formam aqui e ali, junto aos passeios, antes de serem esvaziadas pelo passar dos carros, a pedra da muralha de Évora fica cor de terra seca e de seara madura, lugar comum por estes lados. Toca a esta hora o sino fraco a avisar quem veio ver os mortos, seus ou alheios ao cemitério.Ouve-se o sino ao sol, como se caísse lentamente a noite e precisassem os mortos de ficar em casa, sem mais incómodos de visitas. Dentro das paredes do cemitério nada haverá, além de morte e, nessa morte de sepulcros brancos de mármore e corpos deitados, de terra seca e molhada, há todo um cenário de raios de luz amplificados, uma claridade paradoxal que atrai, muito além dos ciprestes de má fama. Diz-se, não importa se é assim ou não, que na morte se atravessará um túnel e haverá uma luz extasiante que cega e tudo o mais. Há, num cemitério de túmulos brancos de mármore, em momento de loucura solar, luz mais do que suficiente para que um vivo sinta que não está no seu mundo. Que não se percam os vivos em cemitérios destes, pensariamos nós. Toca, último aviso, a sineta que avisa os vivos. A hora avança e faltam agora três minutos para as dezassete. Sai quem tem hora para sair, fica quem não respeita já ou nunca respeitou essas convenções. Não usarão relógio os mortos do cemitério dos Remédios, em Évora, aqui ao lado do carro onde espero que a aula de música do meu filho acabe. Vai chover outra vez quando abro a porta do carro e saio.
1 comentário:
Tenho um cemitério à porta de casa. Talvez um dos mais bonitos de Lisboa.
Sempre que tenho um bocadinho livre por lá passeio com a minha máquina.
Gosto do silêncio e da paz aparente que por lá reina.
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