18/10/13

De cada vez que fechamos os olhos.

Novo. Volta ao mesmo. Traços descontínuos no asfalto negro. Negro e branco, o motor a trabalhar, o cheiro de urze a entrar pelo vidro do carro, negro e branco e palavras pretensiosas sob o efeito de algo como álcool fora de prazo. A vida vista num segundo como um concerto irrepetível num palco que nunca fui capaz de ocupar. A voz escoa-se, épica, na intimidade do último momento breve. Ficas? Eu sigo a partir daqui.
O coração frio, verdade caladas por bom comportamento, o coro a fazer-se sangue, as veias em plena capacidade. Não há eternidade mas vais voltar outro, sabes isso. Gritas, cantas o que sabes poder ser o último hino de ti e sabes que vales milhões de vozes, as que ouves, as que és. Voltas à terra, sabes-te a terra molhada, ao cheiro dos mortos e dos dias de chuva depois do calor. Ouves nomes de países. Volta ao mesmo e sabes que não podes beber, porque vais pedir o que não podes pedir. Negro sobre branco, sem perdão nem culpa. Bebe. Bebe. Bebe. Bebe-te até ao fim, sem remorsos nem compaixão, sem nada. O futuro não existe, o teu, pelo menos e nem tu sabes se és. Ao longe as luzes da cidade. Mais um lugar comum, para além de ti.
P.S. Fui comprar tabaco para começar a fumar. Como tanto acontece e é previsível, não voltei. Ninguém me sentirá a falta, como a um centro comercial que fecha à meia-noite, depois de quase vinte e quatro horas de serviços irrepreensíveis.

P.S. Gosto de massa folhada. Poderia ser o meu último desejo, com doce de ovos e açúcar crocante como cobertura.

1 comentário:

S disse...

Que saudades que eu tinha de ler os teus textos.