05/05/07

Incendeia-me, se quiseres,
Mas fá-lo como se acendesses uma vela num quarto escuro,
De forma a que apenas os nossos vultos possam ser vistos
E não as cores.
E as nossas sombras,
Tímidas,
Serão quase independentes de nós,
Volúveis e imprevisíveis, como a chama.

Passa a tua mão pelo meu cabelo,
Como costumas fazer,
E demora-te por lá.

Se quiseres, podemos usar as frases feitas,
De que habitualmente prescindimos,
E dir-te-ei que gosto de olhar para ti enquanto dormes,
E que gosto de demorar o meu olhar em ti.

Pede-me que fale menos,
Que não tente dar todos os nomes
Àquilo que sentimos,
Que não antecipe tanto o que está por vir,
Que viva mais o nascer que o pôr-de-sol,
Mais manhã, menos noite.

Hoje é outro dia.

Para A.

12 comentários:

Joaninha disse...

"Incendeia-me [...] como se acendesses uma vela num quarto escuro". Palavras com imagem, sem dúvida.

jguerra disse...

Belas imagens. Às vezes é bem melhor ficarmos calados junto de quem amamos, as palavras são tão desnecessárias por o silêncio tudo preencher.
Um abraço

filipelamas disse...

Apaixonante e apaixonado. Cada palavra carrega o perfume do sentimento. O modo como descreves a inutilidade das palavras em tantos momentos é sublime e encerra uma lição tranquilamente gostosa. Inspirado e inspirador.

rtp disse...

Belas palavras! Plenas de sentimento!

x disse...

há muito tempo que não gostava tanto de um poema.*

Blas Torillo Photography disse...

El amor discreto... el que se contenta con lo sencillo... el que sólo quiere que le quiera quien debe hacerlo. Nadie más.

Más mañana y menos noche, dices amigo... y a veces es la vida la que nos da ese consejo.

Un abrazo.

Alberto Oliveira disse...

... a coragem é algo que não está ao alcance de muitos. De mim próprio, para não ir mais longe na procura de milhentos exemplos. Se um dia prenunciasse tais palavras ("Incendeia-me se quiseres... ") à cautela, só de fato de amianto vestido...

Desculpa a ironia -que me está na massa do sangue, mas é de boa-fé. Felizmente que vão havendo boas surpresas na blogsfera. Como as das tuas letras. Parabéns. À séria.

verde disse...

Que poema lindo. Palavras que fazem todo o sentido, para mim. Simplesmente sentir o outro, o seu cabelo, o perfume, sentir a existência do nós em cada um. Sem palavras, sem razão. Só sentir. Lindíssimo.

rtp disse...

Venho, agora, eu aqui agradecer as suas palavras. Na verdade, até hoje pensei que o Baudolino não tivesse lido o post que escrevi sobre o seu blog. Fico muito feliz por, de alguma forma, o post ter contribuído para o regresso das suas letras à blogosfera.
Quando o seu blog - e o do Toutinegra - desapareceram, senti a perda desse desaparecimento. Fui invadida por uma grande tristeza e, então, para libertar esse sentimento fiz o post. Em boa hora o fiz, se ele ajudou ao regresso do seu blog (que consulto todos os dias, relendo muitos dos seus posts - este poema já foi lido várias vezes: é muito belo!). :-)

Lana disse...

Baudolino
este poema é a prova viva que vale a pena ... tudo ...
que seja sempre incendiado por aquilo que desejar ser ... mesmo que seja uma vela num quarto escuro
1 sorriso mto mto luminoso
Lana

AnotaDora disse...

Obrigada pela visita... e quero dizer que já passei aqui, de mansinho, é certo, mas gostei.

Claudia Sousa Dias disse...

Muito belo!

Parabens!

Não te esqueças de me convidar quando lançares a tua antologia.

Gostaria de estar presente.

Um abraço.

CSD