25/12/08

É dia de Natal. Apesar de tudo, é dia de Natal. Apesar da lareira apagada, da manta húmida por sobre os joelhos a fingir o calor, a simular um conforto feito de nada. Ficou para trás o naco de pão e a malga com o caldo enregelado. Vem-lhe à memória a abundância de que ouvira falar na catequese, no banco duro da escola: o ouro, o incenso e a mirra. Se deram valor àquilo, é porque já teriam comida, mesmo que fosse apenas o leite da vaca ou da burra, ou de alguma cabra ou ovelha que tivesse vindo mirar o menino nascido no meio das bestas e do seu calor, e do seu cheiro, com o enlevo e a devoção possíveis a uma cabra ou a uma ovelha. Lembra-se depois de outra coisa que o Menino prometeu mas... ensinaram-lhe que tinha sido na Páscoa. Era igual, palavra de Deus, Homem ou Menino, não tem época nem tempo propícios, como a fruta, como as tangerinas no pino do Inverno frio. "Ainda hoje estarás comigo no Paraíso." Sabe-lhe a redenção, esta frase. Ecoa-lhe como 'glória a Deus' sob o brilho prenhe de vida da estrela que trouxe ouro e insenso e tudo o resto. Amanhã, acordará, talvez no paraíso, com uma estrela que guiará até si gente vinda de todas as partes a dar-lhe coisas, um beijo que seja, um abraço. E, Páscoa ou Natal, terá sido tudo o mesmo porque a vida e a morte correm lado-a-lado, como dois companheiros de escola, no recreio, com as mãos a cheirar a casca de tangerina.

1 comentário:

Claudia Sousa Dias disse...

gosto d cheiro a tangerina nas mãos e ~vo sabor a melancolia e esperança deste teu texto. Acre e doce.

como a casca da tangerina.

CSD